Entrevista com o ex-mecânico de F1 Claudio Gasparini.

Talvez para quem acompanha a Fórmula 1 por fora de tudo que se passa dentro daquele mundo, não saiba o quão complicado é para manter tudo aquilo funcionando, como que é árduo o trabalho de uma equipe, principalmente se for uma equipe pequena!
Mês passado, eu João Vítor Dieter, encontrei num grupo de discussão o comentário de um homem chamado Claudio Gasparini. Nesse comentário ele falava sobre a Andrea Moda (equipe em que trabalhou) e também deixou essa foto que está aí abaixo. Eu, não perdi a oportunidade de tentar entrevista-lo e, para minha sorte, ele aceitou.
Não, eu não o encontrei pessoalmente, apenas usei o Whatsapp e o Facebook para ter contato com ele e isso deu muito certo, a conversa foi ótimo, acabei aprendendo muito sobre como que funciona várias coisas dentro da F1 e me interessei pelas incríveis e até divertidas histórias que ele tem.
Por isso, vou repassar essa história todas para vocês no post de hoje:

Claudio e outros funcionários da Andrea Moda empurrando o carro para a garagem,





Legendas:

BCC: Blog Curva a Curva
CG: Claudio Gasparini



Entrevista:

BCC: Como você se tornou mecânico e por que se tornou apaixonado por velocidade?  

CG: Eu sempre gostei disso, não me lembro a idade de quando comecei a me envolver com carros. Desde muito pequeno eu me envolvia com ferramentas, para se ter uma ideia com seis anos eu já mexia com furadeiras! 
Meu pai era gerente de manutenção de uma fábrica e sempre se interessou por mecânica também, minha família toda nasceu na Itália e por isso esse interesse já era algo cultural.
Com o passar dos anos, mesmo muito jovem, eu já tinha minha própria oficina, mesmo que fosse algo informal e improvisado, isso no fundo da minha casa. Meu pai todo fim de semana mexia no carro dele; limpava o carburador, as velas, coisas que só se fazia antigamente.
Por volta dos 14 anos, ao invés de querer ser mecânico, eu queria mesmo era ser piloto. Eu mexia nesse meu carro. Eu sempre apostava algumas corridas de rua, não aqueles rachas perigosos, mas claro, era algo com um certo risco também.
Na época do Ensino Médio, eu fiz um curso técnico de mecânica, mas eu me decepcionei, porque de mecânica automobilística tinha poucas coisas. 
Após isso, eu comecei a trabalhar em duas empresas como estagiário; Mortex, que fazia embreagens e também como inspetor de qualidade numa fábrica de borracha. Mas meu primeiro emprego bem mesmo foi na fábrica de carburadores Brosol.
O tempo que trabalhei na Brosol foi ótimo, ganhei muita experiência lá, mas após um tempo eu sai desse emprego e voltei a trabalhar na garagem da minha casa, fazia principalmente regulagem de carburador, isso principalmente pelo fato de ter trabalhado na Brosol. 


BCC: Como foi seu 1° contato com o mundo da F1?

CG: Desde muito novo também, meu pai gostava muita da F1 e sempre assistia. Eu foi assistir uma corrida o GP de Mônaco de 1974 com meu pai, o GP do Brasil de 1976 também. Era o ápice do automobilismo, nada chegada perto do nível da categoria, era um sonho ver tudo aquilo de perto. 
Em 1986, eu servia o exército e tinha corrida em Jacarepaguá; eu fugi do exército para assistir a corrida, a emoção de estar lá era tão grande que eu chorava de ouvir o som dos motores. 
Quando eu voltei ao exército, eles quase me prenderam após contar que eu tinha saído de lá para passar 10 dias fora por causa do GP do Brasil. 


BCC: Como e quando você teve seu primeiro contato com uma equipe da F1?

CG: Foi em 1990, quando a Fórmula 1 voltou para São Paulo. Eu, como já era um ''rato'' de autódromo e já ia nos boxes de Interlagos em outras provas, consegui entrar lá sem credencial.
Como era tudo novo na pista e ''pra variar'' as obras ainda estavam meio inacabadas, tudo era uma bagunça; tinha box que nem luz tinha ainda!
Como eu tinha uma facilidade de chegar nas equipes e falava italiano, eu logo me aproximei dos caras da equipe Osella, como eu mostrei interesse em ajuda-los e era quase um italiano como eles, o pessoal começou a valorizar rapidamente lá dentro. Pois além de eu ser brasileiro e saber as ''manhas'' do lugar, eu saia por São Paulo para comprar peças e ferramentas para eles.


 BCC: E como você entrou oficialmente na equipe?  

 CG: Naquela semana do GP do Brasil eu ajudei muito eles, quando de repente chegaram em mim e me deram roupas e uma credencial da equipe, no domingo, eu, por ser o único da equipe que conhecia a cidade, fui buscar o dono da equipe Enzo Osella no aeroporto e com isso convenci ele de trabalhar fixamente na equipe, lá na Itália.

BCC: Nessas experiências com a Osella, o que mais te marcou?

CG: Era a hora do Pré-Qualifying, era muito difícil, pois essa sessão acontecia antes de qualquer outra do fim de semana. Eram 8 carros que participavam, o da Osella era um deles. Para quem era mecânico da equipe, o trabalho nesses dias acontecia a partir das quatro da manhã, pois a sessão classificatória era às oito. Passar para a sessão oficial de treinos já significava muito para essas equipes.

BCC: Em 1990, a Osella foi vendida, para onde você foi depois disso? 

CG: Em 1991 eu fui para Lambo, mas voltei para o Brasil pois não estava dando muito certo, eu nem tinha mais planos de voltar para lá, não parecia haver mais oportunidades. 

BCC: Mesmo assim, você foi para a Andrea Moda em 1992, como foi isso:

CG: Quando eu trabalhei na Lambo, eu conheci um cara que era chefe de um dos carros lá, em 1992 esse cara ia para Andrea Moda, como ele já me conhecia, me ligou convidando para trabalhar com eles na Itália.

BCC: Como foi a primeira experiência com a Andrea Moda: 

CG: Quando eu cheguei lá, vi como a equipe era pequena, havia só 15 mecânicos em toda a equipe, o chassi estava cru, apenas com o monocoque pronto, e isso há trés dias da corrida. A correria para montar o carro foi imensa, o que outras equipes levariam meses para construir, nós tivemos apenas 72 horas para fazer. 
O carro ficou inteiro, mas evidentemente péssimo, deu apenas algumas voltas e parou. Mas em geral o carro não era ruim, era rápido, só pouco confiável. Se houvesse desenvolvimento naquele carro, ele iria andar até no meio do grid. Em Mônaco, conseguimos até largar!

BCC: Quais outras histórias você teve com a equipe? 

CG: Tem muita coisa, mas eu lembro de algumas bem loucas, como no Canadá, a equipe estava enrolada com o contrato do motor com a Judd, provavelmente por não ter pago ainda para eles o que devia. Como a Brabham também usava motores Judd e de último momento o Andrea Sassetti consegui pagar o motor, a gente deu um jeito de arrombar os boxes deles e pegar um motor que estava sobrando para usar no nosso carro.
Outra história que eu lembro é que na França, a gente não pode participar porque o caminhão que ia levar o carro da equipe ficou parado numa greve de caminhoneiros e com isso a equipe levou uma multa enorme por não ter participado no GP, foi aí que a Andrea Moda comecou a desandar.

BCC: A equipe acabou depois do GP da Bélgica, você ficou lá até o fim?

CG: Não, depois de Silverstone eu sai, pois a equipe teve outros problemas e eu desanimei e voltei ao Brasil. Estava na cara que a equipe ia acabar logo assim, a federação já estava irritada com Sassetti, que era um homem cheio de ''rolos'' nos seus negócios, seja na F1, ou lá na Itália mesmo.

BCC: Depois que saiu da equipe, ainda voltou a trabalhar na Fórmula 1?

CG: Eu ainda fiz um bico na Minardi no GP do Brasil de 1993, mas após isso eu só me dediquei ao trabalho em casa mesmo e depois que minha filha nasceu, em Julho daquele ano, eu sai de vez do mundo da Fórmula 1.



   
Algumas fotos da época:














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